Está frio. Mais frio do que eu pensava que podia ser. Desde que cheguei em Floripa — dessa vez, por tempo indeterminado — tenho acordado com o rosto gelado e aquele silêncio que só o inverno conhece. Vivi várias temporadas na cidade, mas nunca tinha experimentado esse inverno do sul que parece pedir licença pra entrar pelos ossos.
E olha, não vou negar: não está sendo fácil. Acordar, tomar banho, lavar louça, sair de casa — tudo parece exigir o triplo de energia. A rotina matinal que eu havia planejado foi por água abaixo. Quase um pecado levantar às seis da manhã quando a sensação térmica é de cinco graus. Minha casinha, apesar de aconchegante, não é das mais quentinhas. Fica no segundo andar e tem uma mania de deixar o vento entrar pelas frestas.
Por outro lado, como alguém que tenta praticar a aceitação da realidade como ela é, venho tentando abraçar essa estação com tudo que ela traz. O silêncio das ruas, a tranquilidade da praia — tão diferentes do verão cheio de turistas —, o convite pra refletir, o clima perfeito pra ficar em casa, com um bom livro, uma xícara de chá soltando vapor na mão e um cobertor que virou meu companheiro oficial.
Um detalhe sobre Floripa é que, apesar do frio e do vento gelado, o inverno costuma trazer muitos dias lindos, com céu azul, sol brilhando e as montanhas ao fundo compondo um cenário inspirador que sempre me encanta, como se fosse a primeira vez.
E o fato de finalmente ter uma rotina, depois de seis meses viajando pela Ásia, me empolga muito. Retomar hábitos que são difíceis de manter em movimento, crescer meus projetos, cultivar hobbies, reorganizar a vida. Mas, por mais que eu quisesse mover mundos, desde que voltei ao Brasil, simplesmente me vi sem muita energia nem pra fazer o básico.
As duas primeiras semanas foram arrastadas. Além de não conseguir produzir quase nada, me senti desanimada, confusa, sem entender direito o que estava acontecendo. Achei que fosse mais uma crise existencial, ou algo do tipo. Até que, aos poucos, e com a ajuda da minha psicóloga, entendi: meu corpo precisava de descanso.
O inverno não acontece só lá fora, ele também está acontecendo aqui dentro.
É hora de viver o meu inverno interno. É hora de me recolher.
Lembrei que, nos últimos seis meses, eu não parei. Além de viajar por vários países, trocando de casa, moeda, idioma e comida o tempo todo, tentei me desdobrar em três: trabalhando, criando conteúdo pro Instagram e também pro projeto de casal com meu companheiro. Também lancei um curso e uma mentoria de autoconhecimento, o que trouxe uma certa pressão pra produzir ainda mais conteúdo no início.
Para fechar a aventura asiática, passei um mês estudando Yoga na Índia. Foi um mergulho profundo em mim mesma, num país cheio de intensidade. Viajar pra lá foi incrível, e com certeza quero fazer de novo, mas, de alguma forma, o corpo sente o barulho, a qualidade de ar, os estímulos.
No meio do curso, vivi o luto de um primo muito querido que morreu de repente, enquanto eu estava do outro lado do mundo. Isso mexeu muito comigo. Foi muita coisa pra processar. Com isso, meu sistema nervoso ficou sobrecarregado, e meu corpo entrou em modo economia de energia.
Então, desde que voltei, enquanto meu corpo pede calma, minha alma vem me pedindo presença. Presença pra escutar tudo que está emergindo entre tantos questionamentos. Sinto que aprendi e me transformei muito nos últimos meses. E tanta mudança assusta até a mim mesma.
Tenho refletido sobre onde investir minha energia, repensado toda a minha criação de conteúdo — dos canais ao posicionamento — e, principalmente, sentido falta de partes minhas que deixei de lado nesse processo e que agora quero integrar (mas isso é papo pra outra newsletter).
O fato é: não adianta resistir ao que é. Se o momento é inverno, o jeito é pegar meu cházinho e me agasalhar. Fazer menos do lado de fora e refletir mais do lado de dentro. Não é sobre parar, mas sobre ir devagar. Organizar, planejar, estruturar. Entender o cenário antes de seguir a todo vapor.
Venho aprendendo que a pausa também é parte importante do movimento. Pausa traz conexão e reflexão. É ela que nos permite dar passos mais conscientes, que não sejam só impulsos.
O mais difícil, sem dúvidas, é lidar com a culpa nesse processo. Porque ir devagar é como nadar contra a corrente. A gente vive numa sociedade que mede nosso valor pelo quanto a gente produz, que nos pressiona a correr, a não parar nunca, a ter uma ideia e já colocar no mundo no dia seguinte. Nessas horas, dá aquela sensação incômoda de que estou ficando pra trás por escolher ir com calma.
Mas, se a gente não para pra reavaliar pra onde essa navegação está indo, em vez de conduzir a vida, é ela que acaba nos levando. E muitas vezes leva pra lugares que nem fazem sentido, que nos afastam de quem realmente somos.
E, como sempre falo, meu compromisso inegociável é ser fiel a mim.
Acredito que há tempo pra tudo. Na hora certa, a primavera volta. E, quando voltar, quero florescer de verdade, de dentro pra fora. Depois vem o verão, com toda a sua luz, pra eu viver meus dias mais solares e compartilhar com o mundo a minha verdade.
É isso que chamo de cultivar uma conexão profunda com a gente mesmo, pra perceber esses momentos e respeitar nossos próprios ciclos. Afinal, como qualquer outra relação, o relacionamento íntimo com quem somos exige escuta, presença e respeito.
Eu espero que você também não resista às suas estações internas e consiga simplesmente fluir com elas.
Com amor,
Renata Stuart